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AÇÃO PENAL
Prof. Patrick Salgado
A inércia da jurisdição penal (ne procedat judex ex officio) se encerra com a iniciativa processual do Ministério Público, legitimado constitucional para a persecução penal (acusação) e titular exclusivo da ação penal pública (sistema acusatório), ou, em situações excepcionais, com a iniciativa processual do particular (vítima), nos casos de ação penal privada (CPP 32 e CP 100 §2º).
A inafastabilidade da jurisdição nas lesões e ameaças de lesões a bens jurídicos tutelados pela lei penal (CR 5º XXXV) e a legitimação do Ministério Público para a acusação (CR 129 I) fazem surgir a ação penal como meio imprescindível para o exercício da jurisdição penal e o cumprimento do dever de persecução penal assumido pelo Estado (vs. vingança privada).
A ação penal é, portanto, dever do Estado, também entendida como obrigatória (princípio da obrigatoriedade da ação penal), dada a ausência de discricionariedade (oportunidade) no seu oferecimento (exercício).
A partir da teoria eclética (Liebman) o exercício da ação se submete a condições (interesse de agir, legitimidade e possibilidade jurídica do pedido – essa última suprimida posteriormente), sem as quais há carência de ação (CPP 395 II).
No campo processual penal há, ainda, uma quarta condição, a justa causa (CPP 395 III).
A legitimação para agir (legitimidade), como primeira condição, significa que a ação penal é atribuída a proteger direitos e interesses próprios e legítimos, individuando-se a pessoa que pode agir em juízo.
No campo penal tem escassa utilidade dada a legitimação constitucional privativa do Ministério Público para o exercício da ação penal pública, ainda que não seja titular do direito material, e a consequente absolvição do réu quando se identifica sua ilegitimidade passiva.
O interesse de agir, como segunda condição, representa a necessidade e a utilidade desse instrumento (ação) para tutelar os direitos ou interesses legítimos.
No campo penal, em regra, não precisa ser demonstrado caso a caso, pois o processo penal é indispensável (obrigatório) e a pena não pode ser aplicada sem o devido processo legal.
Todavia, há entendimento pela ausência de interesse de agir quando o Ministério Público já sabe, de antemão, que ao final do processo ocorrerá a prescrição da pretensão punitiva (prescrição em perspectiva, virtual ou antecipada, STJ 438).
A possibilidade jurídica do pedido, como terceira condição, se refere à abstrata previsão no ordenamento jurídico da providência que se quer atendida.
No campo penal, todavia, não representa qualquer óbice à admissão da ação penal, dada a possibilidade de o juiz corrigir a classificação do fato à norma (emendatio libelli, CPP 383).
A justa causa, como quarta condição para o exercício regular da ação penal, é a demonstração prévia de que a acusação não é temerária ou leviana, pois lastreada em um mínimo de prova (indícios de autoria, existência material da conduta típica e prova da antijuridicidade e culpabilidade).
Justa causa, portanto, é o conjunto de elementos de informação (indícios) que o Ministério Público possui sobre a infração penal.
Como a ação penal se classifica segundo a titularidade ativa (legitimidade) do seu exercício, a ação penal será pública quando promovida pelo Ministério Público (CR 129 I), titular exclusivo das ações penais públicas, como regra geral (CP 100).
Em algumas hipóteses legais (CPP 24 e CP 100 §1º e 102) o Ministério Público depende de representação do ofendido ou "requisição" do Ministro da Justiça, quando a ação penal será pública condicionada, tratando-se de condição especial da ação (CP 107 IV).
A representação da vítima ou de seu representante legal (menor 18 anos ou doente mental, CPP 24, 33 e 39; revogados os arts. 34 e 50), a ser feita em 6 meses (CPP 38 e CP 103) e irretratável após a denúncia (CPP 25 e CP 102) é necessária nos crimes:
- lesão corporal leve (exceto violência doméstica ADI 4424 e STJ 542) ou culposa (inclusive no trânsito) (CP 129 caput e §6º c/c Lei 9.099/95 art. 88 e CTB 291 §1º)
- perigo de contágio venéreo (CP 130 § 2º)
- contra a honra de funcionário público, em razão de suas funções (CP 141 II e 145 e STF 714 - legitimação alternativa, queixa ou representação)
- ameaça (CP 147 p. ún.) e stalking (perseguição, CP 147-A)
- violação de correspondência e correspondência comercial (CP 151 §4º e 152 p. ún.)
- furto de coisa comum (CP 156 §1º) e estelionato (CP 171 §5º)
- alimentação ou transporte sem recursos (CP 176 p. ún.)
- direito autoral (CP 184 §3º c/c 186 III)
Ainda que a legislação use a expressão requisição, que significa ordem, o Ministério Público não está sujeito às ordens do Ministro da Justiça (independência, CR 127), tratando-se de mera representação (CPP 24), nos seguintes crimes:
- cometidos por estrangeiro contra brasileiro, fora do Brasil (CP 7º §3º)
- contra a honra do presidente da República ou dos chefes de governo estrangeiro (CP 141 I c/c 145 p. ún.)
Não há prazo para seu oferecimento e não é possível sua retratação.
A ação penal será privada quando promovida pelo ofendido ou por quem tenha qualidade para representá-lo ou sucedê-lo (CPP 30, 31 e CP 102 §2º, exclusivamente privada ou propriamente dita), em 6 meses (CP 103 e CPP 29 e 38).
No crime de induzimento a erro essencial ou ocultação de impedimento (CP 236 p. ún.) apenas o ofendido pode propor (privada personalíssima).
Se o Ministério Público for inerte no oferecimento da ação penal pública (não denunciou, não arquivou, não requisitou novas diligências, não propôs acordo penal ou não declinou da atribuição, CR 5º LIX, CP 100 §3º e 102 e CPP 29) o ofendido poderá propor ação penal privada subsidiária da pública.
- Honra (calúnia, difamação e injúria, CP 138/140, observada a regra do 145)
- Alteração de limites, usurpação de águas e esbulho possessório, na propriedade privada e sem violência (CP 161 §1º I e II)
- Dano por motivo egoístico (CP 163 caput p. ún. IV)
- Introdução ou abandono de animais em propriedade alheia (CP 164 c/c 167)
- Fraude à execução (CP 179)
- Violação de direito autoral (CP 184 caput c/c 186 I)
- Induzimento a erro essencial (CP 236)
- Exercício arbitrário das próprias razões, se não houver violência (CP 345 p. ún.)
São princípios da ação penal pública: a oficialidade, materializada na característica da indisponibilidade, pois é dever do Estado a persecução penal (CPP 42); a obrigatoriedade, materializado na característica da indivisibilidade, pois não cabe ao Ministério Público escolher quem denunciar (CPP 28 e 48), e da intranscendência, pois não pode denunciar quem não tenha responsabilidade pessoal (CR 5º XLV); e o acusatório, dada a distribuição das funções de acusar e julgar entre órgãos independentes, decorrente do sistema acusatório.
Quando a ação penal for condicionada à representação ou privada, a mesma é regida pelo princípio dispositivo ou da oportunidade, materializada na característica da disponibilidade do ofendido em representar ou propor a queixa em 6 meses (CP 103 e CPP 38), no que incidirá a decadência, também aplicável os princípios da indivisibilidade (CPP 48) e da intranscendência (CR 5º XLV).
A disponibilidade da ação penal pública condicionada e da ação penal privada permitem ao ofendido deixar de mover a jurisdição penal, da seguinte forma:
a) decadência: a vítima não representa ao Ministério Público ou oferece queixa ao Juízo, dentro de 6 meses em que veio a saber quem foi o ofensor (CP 103 e CPP 38)
b) renúncia: a vítima renuncia expressa (CP 104 e CPP 49, 50 e 57) ou tacitamente (CP 104 p. ún. parcialmente revogado pela Lei 9099/95 art. 74 p. ún.), antes do oferecimento da denúncia (CPP 25) ou da queixa
c) perdão aceito: a vítima perdoa o ofensor, nos casos de ação penal privada, expressa ou tacitamente, no processo ou fora dele, até a coisa julgada, mas depende de aceitação (CP 105 e 106 III, CPP 51/56 e 58/59)
d) perempção: a vítima abandona a ação penal privada (CPP 60)
e) composição dos danos civis: no juizado especial criminal (Lei 9099/95, art. 74, p. ún.)
O princípio da indivisibilidade da ação penal estende a renúncia e o perdão dados em relação a um dos ofensores a todos os demais, no último caso, se aceito (CP 106 I e CPP 48, 49 e 51).
A denúncia e a queixa (também chamada de queixa-crime) são as peças acusatórias que iniciam as ações penais, respectivamente, pública e privada.
Seus requisitos estão descritos no CPP 41: a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias (CPP 569), a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo (CPP 259), a classificação do crime (CPP 383, 384 e 569 e STJ 337) e, quando necessário (sob pena de preclusão, CPP 402), o rol das testemunhas.
Além desses: o pedido condenatório, o endereçamento ao juízo competente, a qualificação e assinatura do acusador (se privada, deve ser advogado com poderes especiais na procuração, CPP 44).
Ainda que o CPP 46 estabeleça prazo para o oferecimento da denúncia (15 dias e 5 dias), esse prazo varia em leis penais especiais (federal, eleitoral, abuso de autoridade, economia popular e drogas) e apenas trará prejuízo se comprovada a desídia do promotor. Já a queixa possui o prazo decadencial de 6 meses (CPP 38).
O Ministério Público poderá aditar a queixa (CPP 45) em 3 dias (CPP 46), salvo para incluir novos crimes ou querelados, e se for subsidiária poderá repudiar a queixa, oferecendo denúncia substitutiva (CPP 29).
O juiz poderá rejeitar (recusar seu trâmite) a denúncia ou queixa, apenas no ato de recebimento e nas hipóteses do CPP 395, quando faltar:
- requisito da inicial (CPP 41, portanto manifestamente inepta)
- pressuposto processual (juiz investido, competente e imparcial; parte capaz; inexistência de coisa julgada, litispendência e fato impeditivo; procedimento regular)
- condição para o exercício da ação penal (possibilidade jurídica, interesse e legitimidade, além da condição especial de procedibilidade)
- justa causa para o exercício da ação penal (lastro probatório mínimo)
Da rejeição cabe recurso em sentido estrito (CPP 581 I), mas do recebimento não cabe (salvo nas ações penais originárias, quando cabe agravo, Lei 8038/90, art. 39), sendo possível apenas o trancamento da ação por habeas corpus.
Se a conduta humana violar direito e causar dano a outrem representará um ato ilícito e terá como consequência a obrigação de reparar o dano (CC 186, 187 e 927).
No ato ilícito criminoso a reparação do dano submete-se ao regime da independência das instâncias, em que é possível buscar a indenização na seara cível e na seara penal, sem que a vítima, seus representantes ou herdeiros precisem esperar a conclusão da ação penal (CC 935, CP 91 I e CPP 63 e 387 IV). Trata-se da ação civil ex delicto (CPP 64).
Todavia, como a decisão do juízo criminal poderá influir no juízo cível (CPP 63) é facultado a este último suspender o curso da ação civil ex delicto até que haja julgamento definitivo criminal (CPP 64 p. ún.).
A sentença penal definitiva interferirá na órbita cível (efeitos positivos), quando decidir pela existência do fato ou autoria do delito (prejudicial positiva vinculante).
E impedirá a rediscussão no cível (efeitos negativos) quando reconhecer alguma excludente de ilicitude (CPP 65) ou a inexistência material do fato (CPP 66), bem como a sentença absolutória que se fundamentar na prova de que o réu não concorreu para a infração (CPP 386 IV).
Mas não fazem coisa julgada no cível o despacho de arquivamento da investigação criminal, a decisão que julga extinta a punibilidade e a sentença absolutória que reconhece que o fato não constitua crime (CPP 67 e 386 III) e a sentença que absolver o réu por falta de prova (CPP 386 II e VI).
Em se tratando de estado de necessidade, ainda que a regra seja impedir a indenização da vítima (efeito negativo), se a vítima não deu causa à situação de perigo que justificou o estado de necessidade ela terá direito à indenização (CC 929).
E nas hipóteses de infração penal de menor potencial ofensivo (pena de até 2 anos) correspondentes à ação penal privada ou ação penal pública condicionada à representação (a persecução penal depende da vítima), se a vítima fizer um acordo de reparação do dano (composição dos danos civis) com o infrator ela não poderá propor ação civil ex delicto ou oferecer a queixa ou a representação para a persecução penal (renúncia, Lei 9.099/95 art. 74 p. ún.).
A vítima pode optar por executar a sentença penal condenatória definitiva na esfera cível (CPP 63), que é título executivo judicial, com certeza quanto ao dever de reparar e exigibilidade, cujo valor do dano pode ser estabelecido na sentença pelo juiz criminal (CPP 387 IV) ou, se não fixado, será liquidado no juízo cível (CPP 63 p. ún.).
Mas essa execução estará obstada quando tiver sido proposta a ação civil ex delicto.
Por final, o Ministério Público somente poderá propor a ação civil ex delicto ou a execução da sentença (legitimação extraordinária, CPP 68) nos Estados em que não houver Defensoria Pública instalada.